A batalha de Jenipapo

A batalha de Jenipapo

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Introdução


Introdução



As margens do rio Ipiranga, quando D. Pedro I deu o grito de independência. Este foi meramente um ato simbólico, pois não houve conflito. Posteriormente, as rupturas com a coroa portuguesa começaram a ocorrer por toda à parte.
Foi às margens do rio Jenipapo na província de Campo Maior, no Piauí, que os portugueses desistiram de incorporar o Piauí à coroa portuguesa e conseqüentemente o Brasil foi consolidando as suas atuais dimensões.
No primeiro capítulo apresentamos um panorama do quadro econômico -político mundial e suas influências na então América portuguesa, fazendo uma articulação com a formação da província do Piauí.
No segundo capítulo, realizamos um debate historiográfico articulando conceitos de Estado com os ideais liberais do período.
Já no terceiro capítulo resgatamos a batalha do Jenipapo, a luta da população próxima à província de Campo Maior que ajudados por tropas do Ceará, lutaram contra a dominação portuguesa.

A batalha de Jenipapo


Panorama Mundial as Vésperas da Independência do Brasil


A partir da segunda metade do século XVIII, podemos perceber um período de transição e uma melhor estruturação das sociedades capitalistas e essa sua expansão promoveu uma reorganização, social política e econômica em todo o planeta.1
Nas sociedades do chamado Antigo Regime constatamos uma etapa de modificação e a acumulação de capital gerado pelas práticas mercantilistas burguesa ia declinando e com isso, acompanhamos a emersão de uma nova sociedade.
Já a partir do século XVIII, com a constante diminuição das práticas mercantilista, observamos a queda dos sistemas coloniais em que o amadurecimento dos interesses de algumas camadas sociais nas colônias provocariam uma série de revoltas na luta pela independência.
Ao analisarmos as conseqüências do processo de descolonização, observamos uma substituição de modelos de dominação, deixando de lado as antigas metrópoles emergindo assim, um esquema de dependência nos novos Estados Nacionais.
Assim, constatamos que a independência não modificou o processo das antigas colônias, pois permaneceu o mesmo modelo agrário-exportador em que observamos a exportação de matéria-prima e a importação de produtos manufaturados.
No Brasil, esta continuidade está clara na substituição da exploração do português pelos ingleses e franceses.
Essa mudança das forças de dominação foi lentamente sendo inserida a partir do momento em que Portugal ia perdendo seu poder frente a novas potências capitalista na medida que elas ficavam cada vez mais industrializadas e necessitavam de novas áreas de expansão.
Assim, observamos que as produções nas colônias iniciaram um processo de emancipação das metrópoles que não conseguiam a substituição do modelo do antigo regime e com isso, as antigas colônias passavam a ficar submissa há um mais dinâmico esquema de dominação.
Constatamos que os emergentes Estados Nacionais, cada vez mais industrializados, enxergavam uma barreira ao seu desenvolvimento nos antigos mecanismos de comercio, pois as metrópoles colonizadoras fixavam o preço dos produtos exportados e importados, dos fretes, dos seguros marítimos, das comissões de intermediação comercial e dos financiamentos.
Consideramos assim, que todo o processo de independência esteve articulado a dois movimentos. Um deslocamento dos espaços políticos existente entre metrópole e colônia e a consolidação de novos espaços preenchida pelas novas potencias industriais.2
Ao relacionarmos o processo de descolonização, a América portuguesa apresentou uma nítida diferença em relação à América espanhola. O território colonial português não sofreu uma nova divisão em áreas independentes, mas consolidou-se em um único império do Brasil.
Essa diferença é usada por alguns livros com o intuito de criar uma imagem idealizada de uma identidade nacional em que o Brasil não conhecendo o fracionamento, supostamente teria um processo de independência mais ordenado, pacífico e politicamente mais estável, chegando até mesmo ignorar os conflitos ocorridos.3 Na América portuguesa, acreditamos que no resultado da descolonização houve um nítido contraste: unidade territorial e monarquia imperial.
A ocupação do reino de Portugal não significou o fim da monarquia, apesar da declaração de Napoleão nesse sentido, pois a fuga do rei salva-o de um cativeiro e preserva o estado, apesar da ocupação a vinda da corte para o Brasil, teve conseqüências capitais e imediatas.
A dependência face à Inglaterra expressa no tratado de 1810, tivera para a colônia um aspecto positivo pelo acesso direto às mercadorias inglesas.
Portanto, o rumo posterior à independência, seria marcado pela presença da corte, fazendo da monarquia e suas instituições, uma das peças essenciais ao futuro jogo político.
Assim, a corte deixara de ser um distante poder sediado no ultramar. Alguns autores afirmam que sua instalação no Rio de Janeiro inverteu inteiramente a relação metrópole colônia. A política colonial e metropolitana, as alianças e relações externas passam a ser pensada, tramadas e decididas na colônia.
Na realização do desmantelamento das estruturas coloniais, por força das circunstancia com que se defronta, a coroa expunha-se a uma dupla pressão.
Analisamos primeiramente a pressão dos seus súditos coloniais, em que agora privilegiados pela transferência da corte, desejavam avançar no processo de desligamento da metrópole ou pelo menos conservar as vantagens adquiridas, evitando o retrocesso.
Outra pressão vinha por parte dos súditos metropolitanos que, no reino ou na colônia, continuavam ligados aos interesses colonizadores, como se apresentavam antes de 1808.
No centro desses interesses estava a monarquia absolutista portuguesa, até este período conseguindo preservar-se de todos os avanços constitucionalista que limitaram ou terminaram com todo o poder de outras monarquias mais poderosas.
Dois movimentos liberais anunciavam para Portugal e a sua colônia que os novos tempos haviam chegado. Ambos acontecimentos ocorreram em 1817, uma insurreição de liberais na Bahia e a outra em Pernambuco, e foram duramente reprimidos com prisões e enforcamentos. Assim, o governo absolutista conseguia restabelecer o poder e na colônia evitava a separação do nordeste.
Salientamos que os acontecimentos nordestinos acelerados em pelas insurreições em 1817 não podem ser entendidos fora de seu contexto mais amplo: ambos constituíam a manifestação mais significativa que iriam marcar o período de transição entre o antigo sistema colonial português para os quadros de imperialismo das potencias mais industrializadas da época.
Faz-se necessário destacarmos também, na década que eclodiu as insurreições, a operação de forças externa, no sentido de acelerar ainda mais o processo de deterioração das relações entre aristocracia nativa e os antigos mercados coloniais.
Essas forças podiam ser pressentidas no Nordeste através da ação de agentes comerciais, militares ou consulares das três potencias mais ativas no período: Inglaterra, Estados Unidos e França.
Observamos que tal processo acompanhava a tentativa de integrar a economia brasileira ao mercado mundial.
Portanto, nessa segunda década, vemos a intensificação das potências da época para a internacionalização do Brasil, semelhante àquela que verificamos para o resto da América Latina.
Podemos observar que embora essas potências continuassem a competir uma com as outras, a dependência em relação à Inglaterra estava definida, através do tratado de 1810, onde o rei de Portugal D’ João VI assina um acordo de comércio com a Inglaterra em troca da proteção marítima na sua vinda para a colônia fugindo do exército napoleônico, quebrando assim o pacto colonial.
Portanto, o ensaio revolucionário brasileiro demonstrava um esforço descolonizador de uma camada dirigente nativa que procurou o auxílio da Inglaterra e dos Estados Unidos em sua tentativa de libertação do julgo português.4
Assim, dentro do quadro do nascente imperialismo inglês, ligado a Revolução Industrial, é que podemos compreender a dinâmica de dois movimentos insurrecionais ocorridos no Nordeste em 1817: as velhas linhas legadas pelo monopólio comercial, não interessavam nem aos ingleses, nem aos representantes da grande lavoura e dos representantes de uma burguesia comercial nacional.
É nesse sentido que observamos a convergência dos interesses da aristocracia agrária e dos agentes ingleses. A partir de então, a decorrência natural será a articulação entre a economia inglesa e os proprietários rurais brasileiros.
Podemos concluir que com os instrumentos elaborados após a transferência da corte, condição para a sobrevivência da política de Portugal, a Inglaterra conseguiria modelar o futuro da ex-colônia, tornando-a exemplo clássico de persistência no século XIX de áreas dependentes, especializadas na agricultura de exportação.
A utilização do negro como mão-de-obra escrava foi a fórmula encontrada pelos europeus para o aproveitamento das terras descobertas. A base da economia girava em torno da grande propriedade monocultora e escravista. Portanto, a escravidão e a grande lavoura constituíram a base sobre o qual se ergueu o sistema colonial que vigorou por mais de três séculos.
Ao inaugurar-se o século XIX, esse sistema colonial tradicional entrou em crise. A revolução industrial em pleno desenvolvimento na Europa, o avanço das idéias liberais e o processo de emancipação política das colônias da América alteraram profundamente o modelo tradicional.
Assim, os novos grupos ligados ao capitalismo industrial que passaram a influenciar a política, condenaram a escravidão. A existência de uma grande massa de escravos parecia um entrave à expansão de mercados e a modernização dos métodos de produção. A partir de então o sistema escravista estava condenado.5
Portanto, observamos uma enorme contradição entre a política britânica e os interesses da grande lavoura. Na Inglaterra, o movimento antiescravista ganha grande importância enquanto que no Brasil, o escravo era de vital importância para a economia nas terras brasileiras.
Com isso, chegamos à conclusão que a articulação econômica entre a aristocracia nativa e os interesses econômicos ingleses se deram de forma ora amigável, ora conflitante.
Movimentos insurrecionais atingiram uma grande parte do norte e nordeste das terras brasileiras. Os motins de 1821 que atingiram o Maranhão, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, bem como os levantes de 1822 no Pará, Rio Grande do Norte e em Pernambuco, criaram o ambiente para a proclamação da independência do Brasil e anunciaram a eclosão das guerras pela independência. Para os interesses metropolitanos, ligados diretamente com o comércio colonial, a situação era insustentável.
Instalada na colônia, a Coroa podia continuar existindo com relativa autonomia face ao território metropolitano, mas o mesmo não se dava com os grupos mercantis. Com a abertura dos portos a Inglaterra, os comerciantes portugueses ficaram a margem do fluxo comercial que até então controlavam com exclusividade.
Em 1820, eclode na cidade do Porto um movimento liberal, a chamada Revolução do Porto, limitando o poder real e exigindo a restauração da antiga ordem do poder na colônia. Esta ultima exigência alargaria ainda mais fosso existente entre a metrópole portuguesa e o Brasil.
Assim, o rei liberta os presos políticos de 1817 e jura fidelidade as bases da constituição ainda no Brasil. Fato significativo e revelador da importância da colônia, é que D. João VI volta para Portugal, mas seu filho, o herdeiro da coroa, aqui permanece.
A independência estava em curso, mas ainda não definida. Fracassada a tentativa de manutenção entre as duas partes do reino é na colônia que se dará o desfecho final no conflito que a opõe à metrópole.
Variados e opostos interesses mostrar-se-ão ativos nas lutas pela independência. Diversas forças sociais tentarão influir na formação do Estado Nacional, avançadas umas, reacionárias outras, segundo o segmento da população que representavam.
Portanto, vemos que a forma final que se revestiria o Estado ainda não estava definida, embora o papel do príncipe regente tendesse a ter um crescimento, principalmente quando ele decidiu ficar no Brasil contrariando as ordens de voltar para o reino.
Outro fato que consideramos de grande relevância na decisão de Dom Pedro, é que uma vez ele sendo o instrumento principal da independência, a monarquia ficava em um horizonte possível, tornando mais longínqua as idéias republicanas, presentes desde o século XVIII. A monarquia constitucional contaria ainda com a preferência das classes superiores, que nela viam a garantia da mudança dentro da ordem.
No quadro internacional, uma monarquia na América significava uma vantagem, ainda que fruto de uma rebelião contra uma coroa e uma metrópole européia.
No período em que ocorreu todo o processo de independência, ainda era difícil distinguir os diversos grupos sociais na estruturação do Brasil. Havia senhores brancos, latifundiários de um lado, escravos do outro e trabalhadores livres, mas sem posse de terra. A grande massa do povo se encontrava na dependência de um pequeno grupo de senhores que, durante a época imperial, viriam tornar-se a elite e a aristocracia.6.
A economia correspondia principalmente ao cultivo da cana-de-açúcar, e que aos poucos foi sendo introduzido o café.
Podemos ver ainda, que durante o período de independência, começaram os processos para a formação de uma classe media urbana, única apta a consolidar uma nação moderna, pois desse modo observamos o fortalecimento da unidade estatal e do poder monárquico.
O Brasil, seguindo o exemplo de outras partes da América, começou em 1817 a desenvolver os desejos da liberdade civil. Assim, após uma revolução burguesa na França, uma mudança nas colônias européias na América parecia ser inevitável.
Na eclosão da Revolução do Porto, como era moldado nas idéias liberais, o benefício seria útil ao Brasil, este então, declarou a união.7 Porem, os brasileiros conheceram bem cedo que estavam enganados, pois o desprezo que mostrava a facção dominante em Lisboa por tudo quanto era do Brasil.
Assim, o apoio que se dava a todos os atos arbitrários dos governadores que regiam no Brasil segundo a máxima de Lisboa, as expedições de tropas enviadas ao Brasil contra o desejo dos povos e dos representantes dessas cortes, as criações de juntas desligadas entre si, mostraram as intenções de Portugal, que chamando o Brasil de irmão, mas não havia fato que concordasse com as palavras.
Portanto, o Brasil começa a mostrar os ressentimentos nos escritos impressos e as facções dominantes em Lisboa começaram a responder com ameaças e começou a enviar mais tropas.
Não poucas vezes o príncipe regente informou ao governo de Lisboa sobre a situação política do Brasil, em que descrevia claramente sentimento do povo, e daí prevenindo as conseqüências, mas seus ofícios ficavam sem resposta.
Com isso, Portugal recorre cada vez mais às armas para fortalecer suas pretensões. O Brasil armou-se para defender-se.
Este fato fez com que o príncipe regente convocasse Conselho de Estado, composto por pessoas eleitas pelo povo. Daí expediu um decreto para a criação de uma Assembléia Constituinte e legislativa e finalmente declarou a independência do Brasil por um decreto de primeiro de agosto de 1822 e na mesma data o manifesto justificativo deste procedimento.
Este manifesto era dirigido ao povo do Brasil, mas depois seguiu a outras potências estrangeiras em seis de agosto.
Com este manifesto, o governo traça uma linha de conduta e conseqüentemente a diretriz que o povo deveria seguir ou rejeitar, pois a partir deste manifesto ninguém poderia ficar neutro.
Como resta pouca duvida em relação à alternativa que os brasileiros adotarão, pois havia na colônia um sentimento antilusitano e em relação aos aspectos econômicos, o comércio marítimo não precisava mais da intermediação de Portugal, uma declarada união de vontades no Brasil que se oporá contra as invasões e intrigas vindas de Portugal.
Portanto, no tocante às relações econômicas entre Brasil e Portugal, estas se encontram extintas. Quanto às relações políticas, os dois reinos acham-se unidos, pois reconhecem o mesmo rei e a coroa como descendentes, na dinastia da casa de Bragança.8


1.1 A Formação da Província do Piauí


Durante o período colonial, diversos fatores contribuíram para que os povoamentos deixassem de se concentrar predominantemente no litoral e passasse a colonizar as terras do interior.
É de grande relevância citarmos as barreiras naturais que dificultavam o acesso como Por exemplo à densidade da mata, mas podemos citar dois fatores que foram primordiais para o deslocamento de homens do litoral para o interior. Tais fatores foram à mineração e a dispersão das fazendas de gado.9
O avanço do rebanho bovino terá uma ênfase maior nesse estudo, pois foi a forma de expansão territorial da parte mais ao norte da América portuguesa.
Assim, o avanço do rebanho bovino para o interior é o fator principal para o povoamento da área compreendida na província do Piauí, nosso principal objeto de estudo10.
Diferentemente de como se deu à brusca dispersão mineradora, a penetração das fazendas de gado acontece de forma lenta e gradual. A Bahia é o principal foco dessa da dispersão e outra diferença em relação à expansão mineradora é que seu deslocamento muitas vezes se desliga de sua origem, e a expansão bovina mantém um vínculo com o seu ponto inicial.
Em meados do século XVI, a criação de gado alcança o rio São Francisco e subido suas margens, tanto direita quanto esquerda, povoando todo o curso médio do rio. Transpostas para o norte, as fazendas penetram o que iriam se tornar à província do Piauí.
Esta ocupação está longe de ser distribuída uniformemente. É uma ocupação muito irregular, em que as terras margeadas pelos rios eram onde se encontrava mais densamente colonizado.11
O território que será o Piauí era a área que tinha uma maior concentração bovina, pois com a perenidade dos seus rios e a área com pastos bons tornara-se ideal para a criação de gado.
Em 1772 uma carta régia decreta a separação entre Grão-Pará e Maranhão, com isso é desfeito o estado criado no séc XVII. Assim, são criadas duas unidades territoriais integradas, Maranhão e Piauí, com sede em São Luis12.
A parte administrativa ficava a cargo de Joaquim de Melo e Povoas por mostrar ser muito dinâmico na direção do Rio Negro.
Dos sete capitães-generais que lhe haviam sucedido, D. Francisco de Melo e Manuel da Câmara estava em exercício no período quando a coroa portuguesa chegou no Brasil. Acusado de ser simpatizante do jacobinismo francês sofreu várias sindicâncias até perder o cargo quando descumpriu as ordens da corte para manter a vigilância do litoral, para evitar um possível ataque surpresa dos franceses13.
Em 1811, o Piauí deixa de ser uma província subordinada ao maranhão, abandonando uma situação secundária, passando a ter uma autonomia provincial. Vitória conseguida através de Carlos César Murlamaqui, um bom militar sendo capitão da infantaria da legião de tropas ligeiras dos cavaleiros da ordem de cristo.
Excelente também na área administrativa, providenciando as defesas do litoral da capitania. Houve também um grande salto no setor econômico em que o algodão deixou de ser produzido para uso interno apenas, passando a ser exportado. Contudo, a criação de gado não deixou de ser a economia predominante na região.
O comércio era realizado com o Maranhão ou pelo Maranhão, pois o litoral estava infestado de ladrões dificultando com o comércio com a Europa.
A rivalidade ficava entre duas vilas: Parnaíba e Oeiras, sendo que esta segunda crescia mais do que a primeira, por isso, em 1812 a capital é transferida pêra Oeiras.
Neste período, Oeiras constava de ruas irregulares com casas em distribuição irregular, mas uma população de 14.074 pessoas. Parnaíba concentrava aproximadamente 6000 habitantes. O terceiro núcleo era Campo Maior com cerca de 13000 moradores.
Em 1819, havia no Piauí uma população de 71.371 habitantes, sendo 11.671 brancos, 21.256 negros e 38.173 escravos mestiços.14
O engajamento político não era visível na província, pois o movimento de 1817 em Pernambuco não teve grande propagação nos cidadãos piauienses.
Parecia que os instrumentos coercivos tinham sido suficientes, impedindo a inserção da semente revolucionária. Porém o sucesso da revolução liberal na cidade do Porto em Portugal, no período em que o grito de liberdade da burguesia francesa começou a ecoar na Europa, provocou agitações nas províncias da América portuguesa e as decisões políticas tornaram-se mais violentas causando o espanto de todos.
Assim todas as províncias do norte e nordeste deram inicio aos movimentos separatistas esperando o momento favorável para expulsarem as tropas portuguesas, que ali guarnecem as capitais e unirem-se à liga brasileira.
O governo de Lisboa sabia muito bem disso, mas continuava a iludir o povo, como se contasse com a permanente posse daquelas províncias, pois até nas gazetas de Lisboa se tem publicado cartas, escritas por portugueses, residentes nas províncias em que diziam que havia muitos que aprovavam a independência e a união geral do Brasil.
Com estas notícias publicadas em Lisboa, dissemos que o governo sabia que a dominação no Maranhão e no Pará está a expirar.
O sertão do Piauí, que negocia os gados somente com a Bahia e Pernambuco, é por isso ligado ao resto da confederação brasileira e com a capital não tem outros recursos, conseqüentemente seguirá o impulso da província.15
1 Francisco José Calazans Falcon. Formação do mundo contemporâneo. Página. 23.
2 Denis Bernardes. Um Império entre Repúblicas. São Paulo: Editora Global, 1997. Página 19.

3 Idem. Página. 21
4 Carlos Guilherme Mota. Nordeste 1817: Estrutura e Argumentos. São Paulo: Editora Perspectiva, 1972. Página. 31.
5 Emilia Viotti da Costa. Brasil Monárquico: Reações e transações. (in). Sergio Buarque de Hollanda. (org). Rio de Janeiro. Editora: Bertrand Brasil. 1997. Página: 136.
6 Idem. Página: 221.
7 Barbosa Lima Sobrinho. Antologia do Correio Braziliense. Rio de Janeiro: Editora Cátedra, 1977. Página 568.
8 Ídem. Página. 574.

9 Caio Prado Júnior. Formação do Brasil Conteporãneo. São Paulo. Editora Brasiliense, 1994. Página 56.
10 Ídem. Página 58.
11 Ídem. Página. 58.
12 Arthur César Ferreira: Maranhão e Piauí.(IN). Sérgio Buarque de Hollanda.(org). Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 2004. Página 141.
13 Idem Página 142.
14 Idem Página 144.
15 Barbosa Lima Sobrinho. Antologia do Correio Braziliense. Rio de Janeiro: Editora Cátedra, 1977. Página 637.

Um debate historiográfico

2 Um Debate Historiográfico

Em nossa discussão sobre o Estado, podemos começar com a célebre definição de Max Weber. Segundo este autor, o Estado detém o monopólio da violência legitima na sociedade1.
Esta idéia parece para nós um pouco simplista, porém bastante sedutora, pois em sociedades organizadas como a que vivemos, a violência privada é ilegítima. Portanto, a violência legítima só pode ser aplicada pela autoridade política central ou por aqueles que ela delega este direito.
Assim, observamos que entre as várias sanções aplicadas à manutenção da ordem, a mais radical de todas, a força, só pode ser aplicada por uma instituição social específica claramente identificada, bem centralizada e disciplinada. Estas instituições ou o conjunto dessas instituições é o Estado.         
Ao fazermos uma análise  desse poder exercido pelo Estado, devemos tentar abstrair ao máximo todos os instrumentos coercitivos que nos cercam, evitando assim, uma reflexão contraditória ao aplicarmos um pensamento imposto a nós pelo Estado ao poder repressivo estatal.
Para Pierre Bourdieu, sob todos os aspectos, o Estado aparece para nós como um poder de repressão legitimado pelas sociedades tanto civil quanto política e ao mesmo tempo, este poder tenta justificar sua perenidade através da violência física e simbólica, ou seja,  o aparelho de regulação estatal pode ser entendido como uma ação consciente, mas que mascara uma outra inconsciente.2
Em uma perspectiva homogeneizadora, a cultura aparece como instrumento principal de organização estatal, em que o intelectual ganha posição central na disseminação dos códigos culturais legitimando ou ilegitimando algum ato.
Sendo assim, até mesmo os movimentos dirigidos contra o Estado inconscientemente pedem a sua legitimação.
Com isso, podemos compreender o Estado como um conjunto de instrumentos de poder tanto físico quanto simbólicos encontrados na sociedade.
Assim, é através da violência simbólica que o Estado atua no inconsciente de determinados grupos sociais atingindo seus modos de pensar o mundo e conseqüentemente pensar o próprio Estado. Portanto, a construção do Estado caminha em paralelo com a construção de instrumentos de poder.
No Marxismo, a tendência é a de enxergar a solução do problema político não na subordinação da sociedade civil ao estado, mas o contrário, na absorção do estado pela parte da sociedade civil, na qual consiste a democracia verdadeira  e cujo instituto fundamental tende a eliminar a diferença entre estado político e sociedade civil3.
Marx confirma com precisão a dependência do estado da sociedade civil e do poder político da classe dominante, quando põe o problema da passagem do estado, em que a classe dominante é a burguesia, para o estado, em que a classe dominante é o proletariado.
Ou seja, em nossa investigação sobre a constituição do Estado do início do século XIX, estamos propondo uma esquematização procurando coordenar esses conceitos buscando apresentar uma configuração estatal desse período.
Caracterizado pela transição das sociedades do Antigo Regime e o início do chamado Estado Moderno, podemos interpretar esse Estado como o organismo de transição, em que após a ascensão da burguesia ao poder, esta usa o poder simbólico para a perpetuação dos esquemas de dominação sobre a classe mais pobre.             



2.1 Liberalismo na França

Em nossa análise do quadro social brasileiro do início do século XIX, devemos nos reportar primeiramente à História e idéias da revolução de 1789 na França, pois suas conseqüências tiveram grande influência não só no Brasil, mas em toda Europa e América espanhola.
A Revolução Francesa derrubou uma ordem estabelecida durante séculos. Assim, a Queda da Bastilha, em 1789, destruiu um tipo específico de propriedade e a forma de Estado já consolidada, afirmando como sua base, a igualdade, liberdade e fraternidade.
Portanto, costumamos caracterizar a revolução francesa como uma revolução burguesa, mas burguesa foi a classe que dessa revolução emergiu.
Podemos constatar também que houve uma série de forças sociais empenhadas na destruição do regime absolutista monárquico e também na destruição dos resquícios modo de produção feudal.
Torna-se importante que nos detenhamos  nas movimentações das massas nos campos a nas cidades que já promoviam grandes agitações mesmo antes de 1789. Assim, a grande revolução estava em marcha e nenhuma força tinha condições para detê-la naquelas circunstâncias históricas.
A força da plebe fez cair o regime absolutista, mas podemos ver que aquele povo revolucionário não imaginava que a imediata instauração de um regime de igualdade e fraternidade era apenas um sonho.
Com essa análise, podemos concluir que a liberdade, o entendimento entre os homens e uma nova era de fraternidade, enfim, todas as grandes idéias que formavam a consciência da revolução, acabaram reduzindo-se as liberdades burguesas, ou seja, liberdade político – formal e a igualdade somente jurídica entre os homens.
Nesse sentido, interpretamos esse quadro político, essas idéias liberais francesas, articuladas a ascensão da classe burguesa,  influenciaram todo o pensamento político do mundo moderno.
Vemos então, a inserção inaugural  de um novo sistema político em que podemos descrevê-lo na lógica da oferta e da procura, como a desigual distribuição dos instrumentos de produção de uma representação do mundo político e social já formulada.
Esses ideais liberais fundamentaram principalmente o campo político, em que a concorrência entre os grupos que estão nela envolvidos, o cidadão comum é reduzido meramente ao status de acolhedor dessas idéias que implementa de forma simbólica os ideais burgueses.
Em síntese, podemos concluir que os ideais liberais do final do século XVIII e início do XIX não têm um sentido democrático como costumamos usar em nossos dias.
Investigando o que  foi  dito por Adam Smith em a Riqueza das Nações, em que ele argumentava a doutrina liberal no sentido de afirmar que os capitalistas só pensam em seus lucros, mas para lucrar têm que vender produtos bons e baratos. O que, no fim, é ótimo para os consumidores.
Portanto, já que o individualismo é bom para toda a sociedade, o ideal seria que as pessoas pudessem atender livremente a seus interesses individuais.
Para Adam Smith, o que atrapalhava os indivíduos, o que impedia a livre iniciativa comercial era a intervenção do Estado. Assim, ele defendia o estado mínimo, portanto o Estado deveria intervir o mínimo na economia, ou seja, os investimentos do comércio não poderiam ter nenhuma barreira reguladora do Estado.4
Outro grande filósofo e economista contemporâneo de Adam Smith que teve grande influência no pensamento liberal foi David Ricardo. A sua teoria das vantagens comparativas constituiu a base essencial da teoria do comércio internacional.
Ele demonstrou que duas nações podem beneficiar-se do comércio livre, mesmo que uma nação seja menos eficiente na produção de todos os tipos de bens do que o seu parceiro comercial.
Portanto, David Ricardo defendia que nem a quantidade de dinheiro em um país nem o valor monetário desse dinheiro era o maior determinante para a riqueza de uma nação.     
Segundo o autor, uma nação é rica em razão da abundância de mercadorias que contribuam para a comodidade e o bem-estar de seus habitantes. Ao apresentar esta teoria, usou o comércio entre Portugal e Inglaterra como exemplo demonstrativo.5
Assim, podemos ver que ambos não concluem meramente um tratado de economia, mas sim uma peça de um quebra-cabeça dentro de um sistema filosófico amplo que parte de uma teoria da natureza humana para uma concepção de organização política em que a burguesia iluminista necessitava de uma doutrina que propunha a propagação de ideais capitalistas.
Portanto, toda essa doutrina liberal apareceu como justificação do sistema capitalista, em que ao defender a predominância da liberdade dos interesses individuais da sociedade, estabeleceram uma forma de organização social baseada na propriedade privada dos meios de produção, também denominada sociedades de classes. 
 Assim, vemos entrando no Brasil uma grande e sucessiva  importação de ideais e doutrinas liberais durante todo o final do século XVIII e início do XIX. Nesse período, a liberdade era o grande tema de discussão no espaço público, sobretudo com as medidas tomadas por D. João VI a partir do estabelecimento da Corte no Brasil.
Para entendermos a inserção do pensamento liberal no norte brasileiro devemos nos reportar à ideologia.   
Investida à sociedade, àqueles homens que eram pares e que tinham, na igualdade diante da lei, um dos fatores que poderiam justificá-la, que garantiam a vida e a propriedade.
Nesse momento, podemos definir que  esses direitos passaram a ser considerados inalienáveis e geraram o constitucionalismo com base nas experiências política francesa e norte-americana. A classe dominante enraizada no Brasil começou a entender a liberdade como fator de igualdade total com Portugal6. Ou seja, dentro desse contexto e dos interesses econômicos, passaram a desejar que o então Reino do Brasil permanecesse autônomo e livre, mas em igualdade de condições e de direitos com a antiga Metrópole.
O liberalismo da década de 1820 não concebia o Brasil como uma entidade autônoma e associava os descontentamentos brasileiros ao despotismo do Antigo Regime e à sua forma de administrar o território americano, circunscrevendo-o ao âmbito político.
Ao restabelecer a sua hegemonia sobre o império, tudo voltaria à normalidade e as terras brasileiras seriam tratadas com igualdade, como qualquer outra província do Reino.
Com essas posturas, aproximavam-se do "patriotismo mercantil" existente em Portugal, na época.
Assim,  as propostas parlamentares tinham seus encantos para os negociantes da velha Metrópole, pois previam a retomada dos monopólios e consideravam o Brasil apenas mais uma província para onde se poderia enviar tropas que defendessem as suas consignações principalmente no Nordeste7.
Portanto, o que estava em pauta era a discussão da liberdade entendida como autonomia.
Evidentemente, a anarquia e a desordem, contrárias à liberdade, também mobilizavam a todos. Os impressos destilavam lições de liberalismo e disputavam o que seria melhor, se a soberania da Nação ou a soberania popular.
Assim, coube aos contemporâneos e as gerações posteriores embasarem a criação da Nação brasileira diferente da Nação portuguesa.
Podemos constatar a existência da busca na história passada de um nacionalismo que estava em desacordo e que sequer existia como conceito e realidade, procurando articular uma memória do país fundada nos acontecimentos e no heroísmo de homens tidos como homens de visão, mártires e patriarcas da independência.
Em suma, o conceito de nacionalismo na década de 20 do século XIX é diferente do nacionalismo contemporâneo. Existe uma metodologia aplicada a este conceito que leva-nos a perceber que um sentimento nacionalista entre os negros africanos e as classes menos favorecidas não existiu nos moldes como vemos este conceito hoje.
O nacionalismo é essencialmente, um princípio político que defende correspondência entre a unidade nacional e a unidade política.
O princípio nacionalista repudia o fato de os governantes de uma unidade política pertencerem a uma nação diferente da maioria dos governados.
   Logo, por meio do debate das cortes depreendemos que, para as classes dominantes dos dois lados do hemisfério, a liberdade significava o direito de conservação da propriedade, fosse em âmbito privado ou no círculo mais ampliado do comércio internacional e dos direitos sociais e políticos estabelecidos.
Podemos ilustrar que nesta igualdade da liberdade, obviamente todos excluíam os escravos e libertos dos direitos de cidadãos.
A liberdade, conceito genérico, descia ao concreto das ruas e ao cotidiano de todos.
Devemos afirmar, que ninguém deve pensar que a discussão hipócrita sobre a liberdade, em um país majoritariamente escravista, não chegasse à população dita "de cor", fosse ela escrava ou forra.
Mais ainda, chegava a todos os homens pobres, fossem eles também brancos e despossuídos, como eram parte dos imigrantes lusitanos que aqui chegavam em busca de oportunidades de conquistarem sua autonomia por meio do trabalho.
Assim, observando-se os seus atos podemos afirmar que o fundamental para aqueles homens pobres e despossuídos, "brancos" ou "de cor", era obter diferentes ganhos, que iam de aspectos pessoais até vantagens sociais, econômicas e políticas.
Para os escravos, sem dúvida o maior dos benefícios era a alforria, para a qual muitos – mas nem todos – lutavam com todas as forças.
 Se por um lado não devemos perder do horizonte que homens livres pobres, escravos e forros não tinham necessariamente a mesma interpretação dos direitos naturais que sacramentavam os pactos elaborados pela classe dominante.
Devemos também lembrar que o direito positivo que sacramentou a consolidação dos chamados direitos naturais em códigos, tornando-se fonte inequívoca de direitos e base para a construção de uma determinada cidadania, foi ganhando seu espaço ao longo do século XIX, derrotando outras formas de direito e de entendimento da política e da liberdade.
 Para os escravos, em um primeiro momento, o sonho da alforria pode ter embalado noites de sono.
Os grandes proprietários reclamavam ter que obedecer ao decreto que os obrigava a fornecer 1/5 dos escravos que possuíssem para a guerra, ao passo que os escravos fugiam e se colocavam ao abrigo do comandante para fazer cumprir a lei8.
Não o faziam, evidentemente por patriotismo, mas suas atitudes alimentavam o imaginário do medo da rebelião e causavam pesadelos e preocupação ao povo.
Reclamavam às autoridades sobre os seus direitos de propriedade, não desejando fornecer escravo algum, mesmo sob pena de acusação de não fidelidade à causa nacional. O povo e aliado nos alistamentos, nos combates externos e na construção das fortificações, era uma ameaça porque tentava abrir espaços e construir no cotidiano os caminhos para a liberdade.
Portanto, observamos que a  política sobre a independência e sobre a liberdade, os escravos fizeram uma leitura própria dessas idéias e colocaram-na em prática.
Alguns autores sugerem que é na concepção de liberdade calcada no senso comum em que ao mesmo tempo, os escravos e a classe menos favorecida estariam buscando um maior enraizamento naquela sociedade que estava nascendo com a nova Nação e tentando conquistar um espaço no Estado em construção.
Esta contextualização torna-se também um pouco fora da contextualização, pois para a constituição de um sentimento de nação, os homens têm que necessariamente partilharem a mesma cultura, a qual representa, um sistema de idéias e associações, bem como modos de comportamento e comunicação9.
Os homens pertencem à mesma nação se e só se reconhecerem como pertencentes a ela.10.

A batalha de Jenipapo

3 Piauí em 1823

As idéias liberais chegaram ao Brasil no século XVII e já começaram a ocorrer em algumas províncias o sentimento de emancipação em relação a coroa portuguesa com a chamada conjuração mineira de 1789, a inconfidência carioca de 1794, e a inconfidência baiana de 1798. Todas imbuídas em uma causa comum, ou seja, em torno das idéias liberais.
Esses acontecimentos não podem ser entendidos fora do seu contexto mais amplo. Constituíam as primeiras manifestações mais significativas de uma série de rebeliões que iriam marcar o trânsito do Brasil do antigo sistema colonial português para os quadros do imperialismo da potência mais industrializada da época. Os motins de 1821 que atingiram, Maranhão, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, criaram o ambiente para a proclamação da independência e anunciaram a eclosão das guerras de emancipação.
Mesmo tendo negociado, a peso de ouro, a independência do Brasil, Portugal não escondia suas pretensões de permanecer dominando parte do território brasileiro, particularmente a região norte e meio – norte do Brasil.
Era anseio da coroa portuguesa ter sob seu domínio a província do Grão – Pará, englobando os atuais Estados do Piauí, Maranhão e Pará.
Todavia, a inquietação da população era grande. A vila de Campo Maior efervescia de ideais pró – independência. Oeiras não era diferente, mas Parnaíba deu o primeiro passo.
Alguns autores afirmam que o sentimento de nacionalidade tem início em 1808 com a chegada da família real ao Brasil. Não compactuamos com esta visão, pois basta lembrarmos que a coroa veio forçadamente para a colônia fugindo do exercito de Napoleão. Apoiados nas teses de Hobsbawm acreditamos que o sentimento de nacionalidade tinha uma característica regional, ou seja, o nacionalismo estava ligado mais com as províncias do que com a constituição do Brasil como um todo.
Na parte econômica, o Piauí era bem diferente do que vemos hoje. A atividade pecuária crescia em larga escala. Além da pecuária, o comércio de algodão era considerado o melhor do Brasil, o fumo e a cana – de – açúcar também eram comercializados.
Em 1821, com a volta da coroa para Portugal, estes levaram todo o dinheiro dos cofres brasileiros, algumas províncias começaram a rebelar-se.
Por outro lado, as províncias do norte deviam irrestrita obediência e lealdade a Portugal. O Piauí compunha a nação portuguesa. Era uma espécie de Portugal em plena caatinga. Oeiras, a capital, era infestada de portugueses que queriam a todo o custo ficar com a parte mais rica do Brasil.
Dividido entre as pretensões dos liberais que desejavam a independência e os portugueses que tentavam permanecer com a política colonialista, D. Pedro I proclamou a independência do Brasil em sete de setembro de 1822. Apesar de proclamada a independência, esta não foi homogênea em toda a colônia. No Piauí a noticia chegou em trinta de setembro. A independência precisou ser conquistada no campo de batalha, com o conflito as margens do rio Jenipapo ocorrida meses depois, em março de 1823.
Com a região sudeste da colônia tornando-se cada vez mais independente, Portugal volta-se para a parte mais rica da colônia, que era o norte. Para esta conquista definitiva, Portugal mandou um experiente militar para comandar as tropas portuguesas, o oficial João José da Cunha Fidié, que chegou a Oeiras no segundo semestre de 1822.
As idéias revolucionárias desenvolvidas pelos piauienses vinham da França, do Estados Unidos e de Portugal. A classe dominante e pró – independência propagava os ideais liberais para a massa de portugueses pobres, com uma visão deturpada, fazendo-os crerem na certeza de que homens e mulheres nascem iguais e fazendo - os aderirem a causa da independência.

3.1 Trajetória de Fidié

João José da Cunha Fidié, iniciou sua vida militar como cadete em Janeiro de 1809 no regimento de infantaria n.º 10, tomou parte na guerra da península, participou das batalhas do Buçaco, Albuera, Vitória, Pirinéus, Nivelle, Nive, Orthez e Tolouse, aos sítios de Olivença e Badajoz, e a diversos combates e ações que ocorreram até ao fim da campanha.
Ofereceu-se depois para ir à divisão dos voluntários em Montevidéu, mas não foi admitido por ser tenente moderno. Em 1817 embarcou para o Brasil uma divisão portuguesa, e como o seu regimento não havia sido nomeado para essa expedição, trocou com um oficial de infantaria n.º 15, conseguindo assim partir para a América, onde serviu em 1817 e 1818.
Foi ajudante de ordens do governador da ilha da Madeira em 1819 e 1820, sendo nomeado em Dezembro de 1821, governador das armas da província de Piauí. Voltando então de novo ao Brasil, tomou posse daquele cargo em Agosto de 1822.
Chamado pelas autoridades de Caxias, foi dirigir a defesa dessa vila, mas crescendo as forças dos revoltosos ao passo que as dos defensores iam diminuindo pelas privações e pelo desalento, a praça rendeu-se e Fidié foi preso e mandado oito meses depois entre uma escolta para a cidade de Oeiras. Transferido para a Bahia, passou ao Rio de Janeiro onde ficou encarcerado na fortaleza da Vila Ganhão, até que D. Pedro lhe deu liberdade, permitindo-lhe que regressasse a Portugal. Em 1825 foi nomeado primeiro comandante do Real Colégio Militar, e por vezes durante a ausência do diretor, ficou encarregado da direção deste estabelecimento até que, saindo de Lisboa e apresentando-se no Porto ao duque de Bragança, foi por ele nomeado subdiretor do arsenal daquela cidade. Regressando depois a Lisboa, foi diretor efetivo do Colégio Militar desde 1837 a 1848, ano em que teve a sua exoneração, reformando-se em 1854 no posto de tenente-general.
A vinda de Fidié para o Piauí, um oficial de alta patente e de grande honra em Portugal, com ordens expressas para atuar com energia e assim, a todo custo sufocar e reprimir o processo de independência revela a importância desta parte do Brasil para a coroa.



3.2 Reconhecimento da Independência do Brasil no Piauí


Liderados pelo Dr. João Candido de Deus e Silva, grande magistrado e autor de um dos primeiros ensaios sobre liberalismo no Brasil e mais tarde membro do parlamento imperial e juntamente com a maior fortuna do Piauí, Simplício Dias, em 19 de outubro de 1822 a câmara provincial de Parnaíba reconheceu a independência do Brasil. Era um convite a libertação e um não a presença militar portuguesa em terras piauienses.
Notamos que o ideal liberal interessava as elites, ou seja, os ex – escravos, os portugueses pobres, enfim, a classe mais baixa foi usada como massa de manobra acreditando na liberdade e igualdade entre os homens.
Apesar de um certo alinhamento às cortes portuguesas, os parnaibanos reconheciam a autoridade de D. Pedro de Alcântara, defensor perpétuo do Brasil. Campo Maior, também era um caldeirão de idéias libertadoras.
Com a declaração parnaibana de independência, não restou alternativa a tropas leais a Portugal comandadas por Fidié, senão sufocar militarmente o levante revolucionário no litoral e ao mesmo tempo ver como estava a situação em Campo Maior. A preocupação de Fidié era um foco de resistência portuguesa diante do sentimento antilusitano dos campo – maiorenses.
Corroborando com o boato de que Portugal queria ficar com a parte Norte do Brasil, os portugueses enviaram uma enorme quantidade de armas por volta de 1820, além da vinda de Fidié a Oeiras como governador das armas.

3.3 Tropas Portuguesas a Caminho de Parnaíba


Quando Fidié soube da proclamação feita pela câmara de Parnaíba, estreitando os laços com o império brasileiro, decidiu formar uma força expedicionária com quase todo o seu efetivo militar em direção a Parnaíba, objetivando suprimir os insurgentes e frear a onda libertadora na região.
Para os padrões da época, o caminho de Oeiras para Parnaíba era muito extenso, cerca de 660 quilômetros.
Após onze dias de marcha Fidié chega em Campo Maior, e é recebido por parte da população com o característico sentimento antilusitano, mas por uma parte da população foi recebido com vivas e para demonstrar sua força, Fidié permanece por ali acampado por alguns dias.
Em Parnaíba, os independentes fogem para o Ceará ao saber da incursão de Fidié e quando este chega não encontra nenhuma resistência e restabelece a dominação portuguesa ficando por ali aproximadamente dois meses.
Enquanto as tropas de Fidié restabelecem o poder português em Parnaíba, em Oeiras esperavam a sua saída para proclamarem sua adesão a causa de independência, fato ocorrido em janeiro de 1823.
Declarando todo povo piauiense como inimigo efetivo de Portugal, um destacamento de mil e cem homens partem de volta para Oeiras com uma parada em Campo Maior.
Tropas vindas do Ceará chegam em Campo Maior em fevereiro de 1823 com um efetivo de cem praças objetivando ajudar a libertação do Piauí.
Essa tropa estacionada em Campo Maior, reuniu pessoas da província como a vila de Pirarucuca em que em sua passagem, o exército português encontra uma cidade abandonada. Ao saber do deslocamento de Fidié vindo de Parnaíba, a cidade inteira se mobilizou.




3.4 A Guerra de Jenipapo


Na noite de doze de março de 1823, as tropas cearenses arregimentaram todos os homens das vilas vizinhas montando um exército de aproximadamente dois mil homens e formando assim, um pacto de todos para a luta.
Mesmo sem fardas, a coligação dos combatentes cearenses e piauienses obedeceu ao sinal de comando, suas armas eram espadas velhas, machados, foices e algumas espingardas usadas.
A coalizão dos independentes chegam as margens do rio Jenipapo, de onde pretendiam impedir a passagem do exército português, porém, além de estarem praticamente desarmados, alguns tinham pouca e outros nenhuma experiência em guerras.
Como no mês de março o rio fica quase seco, a maioria dos soldados aferraram em seu leito. Quando as tropas portuguesas próximas a uma bifurcação, o comandante Fidié ordenou que a tropa fosse dividida e que cada uma passaria por uma estrada.
No momento que as tropas portuguesas chegaram próximas ao rio, estas foram atacadas inesperadamente e acabaram recuando e ouvindo os tiros, todos os insurretos saíram de suas posições e foram perseguindo os portugueses pela estrada.
O comandante Fidié, percebendo o vazio deixado pelos portugueses, passou rapidamente o grosso da tropa para o outro lado do rio, escolheu um local favorável, cavou trincheiras, distribuiu armamento pesado, colocou em linha todos os seus atiradores e esperou o retorno dos brasileiros.
O saldo foi de duzentos brasileiros mortos e aproximadamente quinhentos feridos. No lado português sabe – se apenas que os mortos foram enterrados em cinco covas.
O maior mérito desta batalha foi sem dúvida o redirecionamento que o exército português tomou, pois extremamente cansados e com pouca comida, ao invés deles seguirem para a capital Oeiras e tentarem sufocar a adoção à independência por lá, foram para Caxias, no Maranhão, onde a força portuguesa ainda era grande e seu exército podia ser recebido com flores e não com facas e foices e poderem reorganizar-se.
Assim, a batalha de Jenipapo consolidou – se como a batalha mais sangrenta no processo de lutas pela independência do Brasil. Portanto, considerando que o grito as margens do Rio Ipiranga foi meramente um ato simbólico, este conflito entre portugueses e brasileiros as margens do Rio Jenipapo teve importância fundamental para a consolidação do território nacional e não ocorrendo o desmantelamento ocorrido na América espanhola.
A derrota não desanimou os que queriam a independência, eles se recompuseram e pediram auxilio ao general Labatut, em operação na Bahia.
Alguns homens da força expedicionária cearense que combateram em Campo Maior vão posteriormente penetrar novamente no Piauí,visando não mais esta, que já era uma província imperial, mas a província vizinha que se constituíra o centro das operações contra a idéia de independência.



3.5 Pensamento dos Piauienses no Processo de Independência



Sabemos, em perspectiva teórica, após Marx, que não podemos compreender com clareza as formas de pensamento enquanto não descobrirmos as suas origens sociais. Por outro lado, podemos interpretar a sociedade nordestina da década de vinte do século XIX, como uma sociedade escravista e nesse sentido, esta sociedade guarda algumas características básicas.
Portanto, não é correto aplicarmos para a compreensão dos conflitos pela independência e das formas de pensamento emergentes um esquema explicativo do tipo luta de classes, pois a sociedade não era de classes.
Valendo – se da compreensão do universo rústico da população piauiense, procuramos indicar as interferências dos valores liberais europeus na província do Piauí, que deram origem a avaliações ideológicas, tomamos como base as áreas que ocorreram insurreições de cunho liberal no Brasil ainda atrelado a Portugal.
Assim, a convergência para um objetivo comum, a separação de Portugal, apesar de partes especificas de determinados grupos sociais estarem imbuídos de um mesmo objetivo, eles tem um pensamento diferenciado acerca do que seria liberdade e igualdade em uma província independente de Portugal.
Nesse sentido, podemos perceber que a elite era permeada pelos ideais liberais e seus valores na questão meramente econômica.
O caráter popular, portugueses pobres e caboclos, dos que desejavam a independência era representado pelo sentimento que podemos denominar de lusofobia, ou seja, repúdio de tudo o que vem de Portugal.


3.6 Os Insurretos e a Independência

Em um oficio enviado pelo então coronel comandante da armas do Piauí, Joaquim de Souza Martins, ao comandante das armas do Ceará referindo-se aos acontecimentos políticos que se deram na província, este descreve a bravura do comandante das tropas insurrecionais, Luiz Rodrigues Chaves na batalha do Jenipapo e que nas ações de combate, Fidié torna-se vitorioso.
Ou seja, o comandante Luiz Rodrigues Chaves perdeu apenas pela inferioridade do seu exército e foi um homem de grande honra e que por isso, o governador das armas do Piauí faz um pedido para que Luiz Rodrigues Chaves torne-se governador das armas do Ceará.
Em uma carta do sargento – mor Manuel Lopes Teixeira do Regimento número da infantaria de milícias da província do Piauí, também participante da batalha de Jenipapo, este observa que no combate de Campo Maior, o capitão Luiz Rodrigues Chaves, da província do Ceará, no meio do combate, saiu do seu posto fugindo vergonhosamente e com isso, incentivou o processo de desordem e debandamento da tropa.

Representação ao governo da Bahia, informando estar a província do Piauí quase toda pacificada e organizada, menos a Vila da Parnaíba, onde ainda resistem a nossa independência alguns portugueses comandados pelo major João José da Cunha Fidié.

Requerimento encaminhado ao Ministerio do Imperio, solicitando nomeaçao como secretario da provincia de Sergipe del Rei ou do Piaui.

Documentos referentes ao pedido de transferência da sede do governo da província, de Oeiras para a Vila da Parnaíba.


Ofício a Joao Vieira de Carvalho, referindo-se aos acontecimentos políticos do Piauí


Ofício remetendo ao governo imperial as contas da câmara e comandante geral da vila de Caxias, relativas ao procedimento do governo expedicionário e tropas auxiliadoras das províncias do Ceará e Piauí, estacionadas na mesma vila, contas pelas quais se vê o estado de miséria a que se reduziu a cultura da província.



Requerimento encaminhado ao Ministério do Império, solicitando autorizaçao para ir a Inglaterra pleitar ajura em barcos e [honuns], a fim conter as revoltas no Maranhao e Piaui.


Proclamação do juiz de paz da Vila de Parnaíba, alertando o povo, que não comparece à igreja, nem às festas religiosas.




Ernest Geliner. Nações e nacionalismo. Editora Gradiva

NETO, Adriano. 13 de março: uma data injustiçada, www.cadernos históricos monsenhor Chaves, 2004.

LAURENTINO, Pedro. Os anônimos heróis do Jenipapo. Jornal A VERDADE, 70, 2006.

PRADO JUNIOR,Caio. Formação do Brasil contemporâneo, Brasiliense, São Paulo. 23º ed. 1994.

CARDOSO, Fernando Henrique. O Brasil Monárquico V. 2: dispersão e unidade. Bertrand Brasil. 8ºed. Rio de Janeiro. 2004.

MONTEIRO,Tobias. História do Império: a elaboração da independência 2º Tomo II. Instituto Nacional do Livro. 1972.

TAVARES, Luis Henrique Dias. A independência do Brasil na Bahia. 2º ed. Rio de Janeiro. Instituto Nacional do Livro. 1982.